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El voto sin restricción irrazonable

In análise, cidadania, comunicação social, conhecimentos universitários, convenções internacionais, Democracia, desenvolvimento, direitos humanos, educação, ensino superior, história, history, Politics, sociologia on October 20, 2016 at 3:59 pm

 El voto sin restricción irrazonable

por Jota terno 2016_B

Jacob (J.) Lumier

 

Parte I:

El imperativo de reforma de la ley electoral en Brasil

 

El imperativo de reforma de la ley electoral en Brasil es para superar el hecho de que la dicha ley está articulada sobre un cuadro de referencia que nada tiene a ver con los Pactos De Derechos Humanos.

La ley electoral, en su formulación actual, guarda notada discrepancia con las necesidades del desarrollo.  En especial, segrega una desconfianza ante la baja coherencia de las instituciones, las cuales convocan al voto consciente, pero disfrazan la subordinación a la obligatoriedad coercitiva, tenida esta como más allá de la tomada de consciencia del elector.

El derecho del desarrollo, para la estabilidad de las relaciones sociales en escala de la globalización, y como factor de confianza en la democracia, implica (a) el reconocimiento internacional de que los electores tengan asumido la parte que les cabe en la sustentación de un régimen democrático; (b)  que ese compromiso no sea restricto únicamente a las veleidades de los representantes, como ocurre actualmente en el orden contrario al voto recomendado por los Pactos de Derechos Humanos, esto es, en el orden contrario al voto libre.

La sociedad brasileña no encontró todavía una manera de organizar la ley electoral sobre el voto democrático, y, desproveído de cualquier procedencia histórica desde la Constitución de 1824, así como distanciado del derecho del desarrollo en ese aspecto, el Estado mantiene en su lugar el voto coercitivo con sanciones inadmisibles, que es un modelo electoral segregado y heredado de la dictadura, desde antes de la actual Constitución (1988), en que la obligatoriedad forzada en participar de las elecciones impuestas había sido para los dictadores una cuestión de seguridad nacional.

Esa es la razón de la inautenticidad sospechada por comentaristas y autoridades internacionales, los cuales, implícita o explícitamente, admiten que el voto bajo coerción extiende un mantel de incertezas exponenciales, que solapan la credibilidad de los pactos políticos en Brasil.

El otro lado de esa inautenticidad, su coste, es el elenco de puniciones abusivas en vigor, que cercenan la libertad política, la ciudadanía y hasta la nacionalidad de los electores demócratas contrarios al voto coercitivo, así dañosamente objetivados, pero también violentamente atingidos e impactados, puesto que les es vedada cualquier tentativa de contestación legal o recurso institucional.

La paradoja es que la minoría de ciudadanos que no comparecen para votar (hay muchos), por efecto de la persecución que les objetiva, adquieren status crítico delante del régimen, tornados, de esa forma, opositores farrucos de un sistema extraño a los Pactos de Derechos Humanos, que, además, segrega una autoridad del juicio electoral que, subordinada a esa legislación fuera del cuadro, trata la no comparecencia como deserción y, con abuso de su cargo, torna invalidado el registro de los electores.

El posicionamiento aquí defendido por el autor reconoce, tiene base y suma al mencionado Proyecto De Ley del Senado Brasileño, nº244, de 2006, pero extiende su mirada hacia más adelante, para el debate sobre la combinación más cerrada del derecho interno y del derecho internacional de los derechos humanos, es decir, para la reforma completa de la Ley Electoral, que venga a ser capacitada para suprimir integralmente las puniciones abusivas y reverter su actual disposición, en dirección al justo cuadro de referencia de los Pactos de Derechos Humanos, de que Brasil es signatario.

 


Parte II (em Português)

Educação para a cidadania

 

O desafio posto em relação aos jovens nas democracias que ainda não alcançaram o voto livre é dar-lhes a oportunidade de tornar-se um eleitor consciente para exercer o voto sem restrição irrazoável.

 

  1. Quando se defende o princípio de cidadania há que ter em vista a juventude e o eleitor novato. Se o argumento de que o voto obrigatório com sanções educa é falacioso, como foi constatado no caso de Brasil [i], devem cogitar uma alternativa. Neste sentido, o indivíduo que se registra para obter seu título de eleitor deveria participar de um programa de capacitação do eleitor.

Na situação atual de sua participação, o jovem faz seu registro eleitoral em uma conduta burocrática, e permanece largado como estava antes. A adoção do voto livre[ii] deve ser encaminhada como um procedimento que mudará tal situação no Brasil.

  1. Dar-se-á ao jovem a oportunidade de perceber sua participação na história eleitoral mediante simples capacitação que, combinada ao exercício do voto em primeira vez, transformará a conduta burocrática em ato jurídico político.

A obtenção do registro passará a valer como uma passagem dos círculos familiares e psicológicos para o ambiente mais complexo da cidadania, cumprindo a exigência republicana histórica de educação e de instrução do eleitor novato.

  1. Desta forma, além de ser obrigado unicamente a se alistar na justa idade e a votar em primeira vez, e como condição para receber e entrar em posse de seu título, o jovem, em pequenos grupos, deveria ser obrigado a comparecer e participar de encontros ou reuniões, por uma carga horária mínima indispensável, para ler e comentar uma apostila ou um vídeo com instrução sobre o voto [livre], as eleições e o papel do eleitor no funcionamento do regime democrático representativo, e sua importância para as políticas públicas.

A instância controladora não precisaria aumentar custos para alcançar essa finalidade, já que não mais teria despesas com a desprovida atividade de invalidar registros dos eleitores que não compareceram em eleições passadas.

Em consequência, bastaria reaproveitar os enormes recursos disponíveis nos cartórios e tribunais eleitorais, que se encarregariam da execução desse programa de capacitação, sob a competente supervisão do Ministério da Educação.

  1. Muitos opinam que assumir a causa da Declaração Universal dos Direitos Humanos, das Convenções Internacionais que preconizam o voto livre, e a causa das Nações Unidas em favor da educação para a cidadania não seriam motivos suficientes para a mudança do regime eleitoral e adoção do voto livre. Reclamam que seria necessário um motivo político mais forte para isso.

Na verdade, o motivo político para o voto livre existe sim e data de 1983/84 com a grande mobilização do eleitorado na histórica campanha das Diretas Já, marco fundamental da Abertura Democrática no Brasil. Aliás, o voto livre deveria ter sido instituído nos anos 80/90, houve projetos no Congresso Nacional que sustentaram essa mudança.

***

Notas

[i] Veja o posicionamento do Senado em favor da diminuição do elenco de tais sanções contra o eleitor faltoso (Projeto De Lei Do Senado, Nº 244 de 2006). Na realidade, este projeto pode ser entendido como implicitamente orientado no sentido de um voto obrigatório cujas sanções restringiriam o acesso dos faltosos unicamente aos programas e benefícíos governamentais. Quer dizer, seriam obrigados a votar aqueles que ou integram os serviços públicos, ou participam de políticas públicas, programas do governo e alcançam benefícios ou vantagens de qualquer ordem por este concedidas, em qualquer nível. Fora dessas restrições supostamente razoáveis, o voto seria livre.

[ii] Quase todos os países que fazem respeitar as leis onde o voto é obrigatório impõem multas. Alguns embaraçam publicamente os eleitores que não votam ou vão até recusar-lhes os serviços e os benefícios de programas governamentais. Nada obstante, há na República Federativa do Brasil nítida extrapolação de competência em relação à lei que estabelece punições aos eleitores faltosos. Ao invés de classificar as sanções com respeito aos direitos civis e políticos protegidos pela Convenção Internacional de 1966 (ICCPR), o regime proíbe aos eleitores faltosos praticar qualquer ato para o qual se exija a quitação do serviço militar ou do imposto de renda. Quer dizer, o eleitor faltoso é concebido e abusivamente tratado como nocivo à segurança do país.

A Ordem dos Conhecimentos no Nascimento do Capitalismo

In análise, conhecimentos universitários, desenvolvimento, divulgação científica, ensino superior, história, history, pesquisa, sociologia, sociologia do conhecimento on July 21, 2016 at 4:27 pm

O estudo sociológico do sistema cognitivo das sociedades globais no nascimento do capitalismo

Resumo dos resultados da pesquisa de Georges Gurvitch (1894-1965) divulgados em: “Los Marcos Sociales Del Conocimiento”( Les Cadres sociaux de la connaissance).

 

Por

Jacob (J.) Lumier

 

Sumário

Despotismo esclarecido. 1

O papel do saber como fato social 1

O fim do regime feudal 1

Características das sociedades no nascimento do capitalismo. 1

O sistema cognitivo e as classes de conhecimento. 1

Marx e o maquinismo. 1

O conhecimento do mundo exterior 1

o conhecimento técnico. 1

Os aspectos do conhecimento político. 1

O senso comum.. 1

O conhecimento de outro e dos Nós-outros. 1

Os intelectuais. 1

Notas. 1

 

 

 

Despotismo esclarecido

No estudo sociológico do sistema cognitivo das sociedades globais que dão à luz o capitalismo o traço marcante é o despertar do Estado na forma da monarquia absoluta participando ativamente do desenvolvimento do capitalismo nascente e, nessa e por essa atividade, tratando todos os problemas políticos sob seu aspecto econômico.  Daí que os historiadores e os economistas caracterizam a organização política dessa sociedade como “despotismo esclarecido”.

Todavia, além dessa vinculação ao “Estado ressuscitado”, o caráter particular desse tipo de sociedade inclui os começos do maquinismo, as primeiras fases da industrialização, a transformação do trabalho em mercadoria, a aparição das classes sociais propriamente ditas (estrutura de classes) e, do ponto de vista da tipologia qualitativa e descontinuista [i], certa diminuição do desacordo entre a estrutura global e o fenômeno social total subjacente.

 

O papel do saber como fato social

 

Em conseqüência, não se pode minimizar o papel do saber como fato social nesse e para esse tipo de estrutura, devendo-se acentuar a reciprocidade de perspectivas que aqui se configura entre experiência e conhecimento.

Como já tivemos a ocasião de notar, Gurvitch assinala que frequentemente não é possível ir além das explicações por correlações funcionais e buscar o máximo de coerência do processus de reestruturação como fundado numa causalidade singular deixando o fato social do saber como epifenômeno.

A causalidade singular somente é aplicada quando se está perante um caso de desacordo preciso de quadro social e saber, como nas análises de Karl Marx em que o saber da Economia Política clássica está em desacordo com o quadro da sociedade de classes ao qual pertence.

Nesses casos, se poderá estabelecer uma determinada mudança social como a causa particular de que a estrutura é o efeito, polarização esta que, aliás, muitos tentaram fazer apressadamente para este tipo de sociedade que dá à luz o capitalismo, atribuindo ao advento do maquinismo o papel de causa singular da mudança estrutural, o que excluiria o alcance ou a relevância do saber como fato social para a reestruturação desse tipo global [ii].

 

O fim do regime feudal

Ao falar de diminuição do desacordo entre a estrutura global e o fenômeno social total subjacente, Gurvitch tem em vista uma comparação com as sociedades feudais, em cujo tipo nota-se um desacordo cuja intensidade é um fato novo, a que se conjuga um “pluralismo excepcional” da estrutura em si.

A explicação aqui assenta o fato singular produzido ao fim do regime feudal, quando tem lugar a aliança dos monarcas feudais com as cidades francas ou abertas que compraram sua liberdade ao Estado territorial reanimando-o. Assim é a mudança social levando à reanimação do Estado recuperando forças com a referida aliança que constitui o elemento máximo de coerência da teoria para as sociedades feudais, restando, então, o saber como fato social em estado preponderantemente espontâneo e difuso, sem que seja feito valer.

 

Características das sociedades no nascimento do capitalismo

 

Com efeito, tirado do seu sono secular por essa aliança singular, o Estado toma a forma da monarquia absoluta como dizíamos, constituindo na análise gurvitcheana um traço característico das sociedades globais que dão à luz o capitalismo.   Na Europa Ocidental, são os séculos XVII e XVIII os que correspondem a esse tipo de sociedade, já iniciada durante a segunda metade do século XVI, sobretudo na Grã-Bretanha.

Segundo a descrição de Gurvitch, excluindo a equivocada atribuição do papel de causa singular para o advento do maquinismo e resgatando o alcance ou a relevância do saber como fato social para a reestruturação desse tipo de sociedade global que dá à luz o capitalismo, nota-se: (1) – o predomínio do Estado territorial monárquico de grande envergadura, que atribui ao monarca o poder absoluto, e que se aliou com a burguesia das cidades e com a nobreza ligada à burocracia, dita nobreza de toga; 2) – o Estado apóia aos plebeus burgueses, aos capitalistas industriais das manufaturas, aos comerciantes de envergadura internacional e, muito particularmente, aos banqueiros, quem, enriquecidos depois da descoberta do Novo Mundo, tornaram-se seus credores; 3) – e os apóia contra a nobreza de espada, contra os operários e os camponeses, substituindo assim a antiga hierarquia das dependências feudais por uma nova.

Quanto aos níveis em profundidade da realidade social, nota-se em primeiro lugar duas classes de modelos: os modelos idênticos às regras jurídicas, tomados como regulamentação minuciosa feita de cima para baixo, e os modelos técnicos, estes nascidos das fábricas, exatamente como um aspecto do transtorno da vida econômica, ambos inovadores; em segundo lugar, nota-se incluindo todo o mundo dos produtos, a base morfológico-demográfica como estando ligada à necessidade de mão de obra e ao problema de seu recrutamento; e em terceiro lugar, nota-se os aparelhos organizados de toda a classe, cuja burocratização começa;

Nota-se igualmente que: (a) – a enorme impulsão da divisão do trabalho técnico, superando muito a divisão do trabalho social, sendo combinada ao maquinismo, tem por conseqüência uma produtividade sem precedentes em quantidade e em qualidade; (b) – a acumulação de riquezas, acelerada pelo descobrimento do Novo Mundo, alcança em tempo record grandes proporções agravando os contrastes entre a pobreza e a opulência.

Assiste-se em particular à vitória do natural sobre o sobrenatural, da razão sobre toda a crença; bem como ao crescimento do individualismo em todos os campos, e ao nascimento da idéia do “progresso da consciência”, sendo a reter que a expressão mais completa da civilização e da mentalidade própria dessa sociedade no seu apogeu é a “época das luzes”, que faz o homem confiar no seu êxito e no das suas empresas técnicas e indústrias.

Quanto ao mais, já repetimos que não se pode minimizar o papel do saber como fato social para este tipo de estrutura e de sociedades globais que dão à luz o capitalismo. A diminuição do desacordo entre a estrutura global e o fenômeno social total subjacente favorece na teoria sociológica a prevalência das correlações funcionais sobre a causalidade singular.

 

Sistema cognitivo e classes de conhecimento

 

Desta forma, decompondo o sistema cognitivo desse tipo de sociedade, Gurvitch assinala que o primeiro lugar na ordem dos conhecimentos é compartilhado pelo conhecimento filosófico e o conhecimento científico, que se completam mais do que competem.

Se nas sociedades feudais e no curso para a forma da monarquia absoluta, ocultando grande desacordo da estrutura no conjunto (pluralismo excepcional da estrutura), o saber como fato social não é feito valer, restando difuso, por contra nas sociedades que dão à luz o capitalismo a preeminência das correlações funcionais faz ver a maior valoração do saber, cujo papel é de alta eficácia para o equilíbrio da estrutura no conjunto.

Com efeito, gurvitch insiste a respeito deste papel significativo do saber como fato social, traçando de inicio um esboço histórico do salto prodigioso da ciência desde a renascença, cujos expoentes, como se sabe, são os seguintes: Copérnico (1473-1543), Kepler (1571-1630), Galileu (1564-1642), nos conhecimentos astronômicos; Newton (1643-1727) inventa o cálculo infinitesimal no mesmo momento em que Leibniz (1646-1716) também o faz de outra forma, ambos fundadores da física mecânica; a química moderna nasce com Lavoisier (1743-1794); as ciências do homem se desenvolvem dividindo-se em muitos ramos, seguintes: a economia política é criada por Adam Smith e David Ricardo e, com outra forma, pelos fisiocratas; a ciência política se afirma com Hobbes, Spinoza, Locke, Montesquieu, Rousseau, os enciclopedistas, Condocert, e Destut de Tracy (Montesquieu já pressente o advento da sociologia).

Nota-se, igualmente, a reforma do ensino, cada vez mais laico, a acelerar o desenvolvimento do conhecimento científico, sobretudo a partir de 1529, com a fundação do Collège de France.  Todos os grandes filósofos participam das discussões científicas (com alguma reserva, pascal e Malebranche) já que a laicização do saber filosófico, cada vez mais independente da teologia, favorece sua tendência a fazer das ciências a base de suas reflexões.  Nota-se, entretanto, que o contrário não se verifica e os cientistas mostram pouco interesse pelo saber filosófico como tal.  Mesmo assim, o prestígio do conhecimento filosófico está em que é o melhor colocado para defender a ciência contra a teologia e, além disso, são os filósofos quem amiúde emitem hipóteses verdadeiramente científicas, como Descartes e Leibniz.

Nesta descrição proporcionada pela análise sociológica de Gurvitch, o saber filosófico acolhe mais o racional sobre o místico, excetuando a Pascal, um pouco a Malebranche e a Spinoza, místico da racionalidade; da mesma maneira, acolhe mais o adequado sobre o simbólico e ainda favorece a combinação do conceitual e do empírico, do especulativo e do positivo e, finalmente, o predomínio da forma individual sobre a forma coletiva, esta última, por sua vez, muito relegada, aqui, no saber filosófico.

O conhecimento científico, por sua vez, tem a acentuação do elemento racional como exclusiva sua; aqui, o conceitual predomina sobre o empírico e a forma coletiva é preponderante; nota-se a formação de equilíbrio do positivo e do especulativo, assim como do simbólico e do adequado.

 

Marx e o maquinismo

 

Karl Marx tivera razão ao insistir no primeiro tomo de O Capital (cf.tomo I, 4ªseção, caps. XIV e XV) que não são as invenções técnicas as que tiveram por resultado a profusão de fábricas, mas, pelo contrário, foi a divisão do trabalho técnico nas grandes fábricas cada vez mais numerosas que criou a necessidade de técnicas mecanizadas e provocou assim a introdução das máquinas, tal como confirmado pelo estudo das técnicas industriais dos séculos XVII e XVIII.

 

O conhecimento do mundo exterior

 

Quanto ao segundo lugar no sistema cognitivo dessas sociedades que dão à luz o capitalismo, corresponde ao conhecimento perceptivo do mundo exterior, com as seguintes características: (1) – a rápida promoção desse conhecimento (1a) – deve-se à criação dos novos meios de comunicação que acompanham a extensão do comércio em escala mundial, favorecendo o conhecimento dos oceanos e de continentes até então desconhecidos; (1b) – além disso, o que também permitiu comunicações relativamente rápidas foi o aumento e o melhoramento dos caminhos que cruzam os países ocidentais favorecendo a maior circulação das diligências.

(2) – Todavia, a análise de Gurvitch tem por mais relevante as novas percepções e conceituações das amplitudes e dos tempos em que se encontra imbricado o mundo exterior: 2.1) – nota-se uma competição entre os tempos “adiantado a respeito de si” e o “tempo atrasado”, correspondendo a uma estrutura de uma só vez inovadora e anacrônica, competição esta que anuncia um tempo em que o passado, o presente e o porvir irão entrar em conflito rapidamente, numa situação explosiva que favorecerá o porvir, com o “tempo surpresa” ameaçando quebras nas poderosas organizações da superfície;

2.2) – essa competição entre o tempo adiantado e o tempo atrasado aplica-se igualmente ao fenômeno social total global subjacente à estrutura, de tal sorte que encontramos, por um lado, que o conhecimento do mundo exterior, a vida econômica, as técnicas industriais, o comércio internacional, o saber filosófico, a burguesia e sua ideologia estão essencialmente adiantados em relação à estrutura, enquanto que, por outro lado, a nobreza, o clero, a vida agrícola, o campesinato estão atrasados a respeito da mesma.  A própria monarquia absoluta está adiantada a respeito de suas iniciativas e atrasada quanto a sua organização e suas conseqüências.

2.3) – Desta forma Gurvitch avalia que a quebra do Antigo Regime foi muito mais espetacular do que as revoluções inglesa e holandesa ou do que as guerras religiosas e civis, incluindo nesta lista a guerra da independência nos Estados Unidos; e que esta quebra do antigo regime não se apagará jamais da memória coletiva das sociedades que virão.

2.4) – Temos, então, que esses tempos e amplitudes em que se encontra imbricado o mundo exterior, embora rico em incógnitas e em possibilidades novas, se fazem particularmente mensuráveis com o lema da classe burguesa que toma consciência da sua existência: “tempo é dinheiro”, a que se junta: “todos os caminhos conduzem ao ouro, ou, pelo menos, ao dinheiro”.

Quer dizer, todas as amplitudes são apreciadas menos pelo sistema métrico e mais pelo tempo necessário para percorrê-las, decorrendo desta quantificação que o mundo exterior se torna um objeto de estudo científico.

Em maneira idêntica, desse modo de apreciar as amplitudes pelo tempo necessário para percorrê-las decorre a posição de relevo alcançada conjuntamente pelo conhecimento perceptivo do mundo exterior e pelo saber científico no sistema cognitivo do tipo de sociedades que dão à luz o capitalismo.

Aliás, essa posição de relevo alcançada conjuntamente é muito mais significante aqui do que em muitos outros tipos de sociedade, ocultando o fato de que o saber científico prepara o salto que na etapa seguinte do capitalismo o levará ao primeiro lugar.

 

o conhecimento técnico

 

No terceiro lugar desse sistema cognitivo vem o conhecimento técnico, que deu um salto considerável, e isto não só na indústria (ramos dos têxteis e da metalurgia), mas na navegação e na arte militar.

Reitera Gurvitch como já o notamos que o aperfeiçoamento do conhecimento técnico levando ao maquinismo se encontra em relação direta não com as aquisições da ciência, mas com as melhoras de ordem prática, o que já fora assinalado por Adam Smith e por Karl Marx, apesar de suas diferenças intelectuais.

Neste tipo de estrutura e de sociedades globais que dão à luz o capitalismo observam-se ainda como retardados a respeito das técnicas, não só o movimento demográfico, mas a organização da economia, que é prejudicada pelos vestígios das corporações de ofícios (vestígios pré-capitalistas), assim como as invenções e suas aplicações não seguem uma curva de avanço regular.

 

Os aspectos do conhecimento político

 

Por sua vez, o conhecimento político, tanto implícito ou espontâneo quanto explícito ou formulado, ocupa o quarto lugar desse sistema cognitivo, ainda que possa parecer surpreendente essa colocação tão baixa em face do meio fértil em intrigas constituído pelos grupos privilegiados no Antigo regime.

Há que distinguir três aspectos seguintes:

1º) – o conhecimento político implícito está evidentemente estendido na corte em função de várias rivalidades seguintes: (a) – rivalidade da nobreza de espada e da nobreza de toga; (b) – de toda a nobreza e da burguesia em ascensão; (c) – rivalidade entre as diferentes frações da burguesia: a industrial, a comercial, a financeira;

2º) – esse conhecimento político espontâneo se encontra ausente no meio das classes populares representadas pelos operários das fábricas e pelo “campesinato”. Derrotados pelas mudanças de estruturas que nada lhes traz de benefício essas classes populares permanecem não sabendo o que fazer ou que tática adotar numa situação que, em geral, lhes é muito desfavorável.  Aliás, a respeito disso, Gurvitch nos lembra que a consciência de classe e a ideologia dos operários e dos camponeses não se formarão antes do século XIX, e muito depois das grandes comoções da Revolução francesa.

3º) – Na medida em que se mantém, o Antigo Regime necessita de uma política que não leva geralmente em conta os grupos de interesse, por privilegiados que sejam.  Quer dizer, as disputas políticas e, conseqüentemente, o conhecimento político das pessoas são de importância secundária para o absolutismo.

Por sua vez, esses grupos de interesses (os que têm futuro e os mais adiantados e clarividentes) encontram uma compensação na elaboração das doutrinas políticas, cujo esquema tirado da análise gurvitcheana é o seguinte:

(a) – na Inglaterra, Thomas Morus (“Utopia”, 1516) e Francis Bacon (“Nova Atlântida”, inconclusa), durante a renascença; posteriormente, nos séculos XVII e XVIII, os escritos de Hobbes e Locke correspondem, nessa análise sociológica, às aspirações da burguesia ascendente como quadro social do conhecimento, que, finalmente, só então triunfará;

(b) – na França: os fisiocratas, os enciclopedistas, Turgot, J.J.Rousseau terão influência desde o começo e durante a revolução, e suas doutrinas tratam tanto do fim ideal quanto da tática a empregar para alcançá-lo, tipificando o conhecimento político formulado ou elaborado, não-espontâneo ou não-implícito;

(c) – na Holanda: o “Tratado Político” (1675-1677) de Spinoza faz pressentir segundo Gurvitch certos elementos do pensamento de Rousseau;

Nota-se que nas doutrinas políticas (e nas ideologias em que se inspiram) apesar do predomínio da forma racional “o simbólico, o especulativo, o conceitual, e o individual são sempre muito acentuados”, mesmo naquelas doutrinas mais preocupadas pela racionalidade, pelo empirismo, pela objetividade, pela adequação.  Já no conhecimento político espontâneo, a forma racional se combina à forma empírica, estando igualados em importância o positivo e o individual.

 

O senso comum

 

Quanto à sociologia do conhecimento de senso comum, aqui, neste tipo de sociedades globais dando à luz o capitalismo, conhecimento situado em penúltimo lugar, está marcado pela grande multiplicidade dos meios que lhe servem de quadro social de referência.

Quer dizer, o conhecimento de senso comum neste tipo de estrutura e de sociedades globais que dão à luz o capitalismo está consideravelmente confundido pelo seguinte: por um ambiente tão novo e imprevisto; pelo advento do começo do capitalismo e do maquinismo; pelo descobrimento do Novo Mundo; pela política absolutista de nivelação dos interesses; pelo debilitamento da igreja; pela afluência das grandes massas da população às cidades, etc.

Assim, esse conhecimento de senso comum se encontra disperso em vários meios, seguintes: (a) – entre os cortesãos, os representantes da nobreza de espada e os da nobreza de toga; (b) – nos diferentes grupos da burguesia, no novo exército profissional, entre os marinheiros, etc., ou ainda, entre os operários da fábrica.

Seu refúgio será, então, a vida rural e os círculos restritos da família doméstica conjugal.  Gurvitch nos lembra a observação de Descartes de que o senso comum é “a mais compartilhada” das faculdades, avaliando que o mestre do racionalismo moderno resistia desta maneira à tentação de negar a existência mesma dessa classe de conhecimento, “provavelmente pressionado pelas contradições crescentes entre os diversos beneficiários do conhecimento de senso comum”.

Enfim, nota-se a disputa entre a forma mística e a forma racional desse conhecimento de senso comum, em particular no clero e no campesinato (“paysannerie”).

 

O conhecimento de outro e dos Nós-outros

 

No último lugar desse sistema cognitivo das sociedades globais que dão à luz o capitalismo vem o conhecimento de outro e dos Nós-outros que: 1) – como o conhecimento de senso comum, também se encontra em grande dispersão pelos diferentes meios relacionados com a atualização da sociabilidade das massas, com a política de nivelação do absolutismo e com a desintegração dos grupos herdados da sociedade feudal, estando em nítida regressão a identificação do conhecimento dos Nós-outros ao “espírito de corpo”.

2) – Todavia, Gurvitch observa que se nota um novo conhecimento de outro, servindo de compensação parcial para o rebaixamento desse mesmo conhecimento de outro como de indivíduos concretos, lembrando-nos que tanto na classe proletária nascente como na classe burguesa ascendente, ambas penetradas da ideologia de competição e de produção econômica, o conhecimento de outro é quase nulo.

Nosso autor acrescenta que, nesse novo conhecimento de outro, se trata de uma tendência para universalizar a pessoa humana que se relaciona a Rousseau, com sua teoria da vontade geral idêntica em todos, e a Kant, este, com seu conceito de “Consciência Transcendental” e de “Razão Prática”, que chega à afirmação da “mesma dignidade moral” em todos os homens [iii].

Quer dizer, tem-se um conceito geral do outro fora de toda a concreção, de toda a individualização efetiva, acentuando-se as formas racional, conceitual, especulativa e simbólica, com tendência frustrada a reunir o coletivo e o individual no geral ou no universal.

Os intelectuais

Para encerrar, Gurvitch nota que as sedes de intelectuais encarregados de manter esse sistema cognitivo, desenvolvê-lo e difundi-lo se enriqueceu com a adição de novos grupos e novos membros, destacando-se junto aos filósofos, aos estudiosos, aos docentes a entrada dos representantes das “belas letras”, dos escritores, dos doutrinários políticos e por fim dos inventores de técnicas novas.

 

***

 

 

Notas

[i] Ultrapassando o nominalismo e o individualismo limitando o pensamento probabilitário do criador da tipologia qualitativa, Max Weber, que terminou por aplicá-la no vazio do culturalismo abstrato, a pesquisa de Gurvitch tem orientação dialética, sendo voltada para acentuar o caráter intermediário dos tipos sociológicos que “representam quadros de referência dinâmicos adaptados aos fenômenos sociais totais e chamados a promover a explicação em sociologia”.  Daí decorre a importância em distinguir (a) – entre generalização, singularização e sistematização, bem como (b) – entre repetição e descontinuidade, sem falar na distinção (c) – entre explicação e compreensão, pois estas distinções e critérios dos tipos sociológicos só podem ser utilizados numa orientação de teoria dinâmica. Ver Gurvitch, Georges (1894-1965) et al.: “Tratado de Sociologia – vol.1 e vol. 2″, 2ªedição corrigida.

 

[ii] Como se sabe, o aperfeiçoamento do conhecimento técnico levando ao maquinismo se encontra em relação direta não com as aquisições da ciência, mas com as melhoras de ordem prática – como já fora assinalado por Adam Smith e Karl Marx, apesar de suas diferenças.  Quer dizer, Karl Marx tivera razão ao insistir no primeiro tomo de “O Capital” de que não são as invenções técnicas as que tiveram por resultado a profusão de fábricas, mas, pelo contrário, foi a divisão do trabalho técnico nas grandes fábricas cada vez mais numerosas a que criou a necessidade de técnicas mecanizadas e provocou assim a introdução das máquinas, tal como confirmado pelo estudo das técnicas industriais dos séculos XVII e XVIII.

 

[iii] Em sociologia, o interesse pelo homem como indivíduo específico e diferente de seus semelhantes é reconhecido.  A individualidade concreta tem sua dignidade moral reconhecida na Declaração dos Direitos Sociais. Ver: Gurvitch, Georges: “La Déclaration des Droits Sociaux”.

 

Educação para a cidadania

In Bem-estar, cidadania, convenções internacionais, Democracia, desenvolvimento, direitos humanos, educação, Politics, sociologia on July 3, 2016 at 1:41 pm

 

Educação para a cidadania

por Jacob J. LumierJota terno 2016_B

(Observações acolhidas junto ao OHCHR_Forum on Human Rights, Democracy and the Rule of Law)

 

O desafio posto em relação aos jovens nas democracias que ainda não alcançaram o voto livre é dar-lhes a oportunidade de tornar-se um eleitor consciente para exercer o voto sem restrição irrazoável.Sociólogos sem Fronteiras - Rio de Janeiro

 

Quando se defende o princípio de cidadania há que ter em vista a juventude e o eleitor novato. Se o argumento de que o voto obrigatório educa é falacioso, como foi constatado como foi constatado no caso de Brasil (1), devem cogitar uma alternativa. Neste sentido, o indivíduo que se registra para obter seu título de eleitor deveria participar de um programa de capacitação do eleitor.

 

Na situação atual de sua participação, o jovem faz seu registro eleitoral em uma conduta burocrática, e permanece largado como estava antes. A adoção do voto livre (2) deve ser encaminhada como um procedimento que mudará tal situação no Brasil. Dar-se-á ao jovem a oportunidade de perceber sua participação na história eleitoral mediante simples capacitação que transformará a conduta burocrática em ato jurídico político. A obtenção do registro deve valer como uma passagem dos círculos familiares e psicológicos para o ambiente mais complexo da cidadania, cumprindo a exigência republicana histórica de educação e de instrução do eleitor novato.

 

Desta forma, além de ser obrigado unicamente a se alistar na justa idade e a votar em primeira vez, e como condição para receber e entrar em posse de seu título, o jovem deveria ser obrigado a comparecer e participar, por uma certa carga horária, de encontros ou reuniões em pequenos grupos, para ler e comentar uma apostila com instrução sobre o voto [livre], sobre as eleições e o papel do eleitor no funcionamento do regime democrático representativo, e sua importância para as políticas públicas. A instância controladora não precisaria aumentar custos para alcançar essa finalidade. Bastaria reaproveitar os enormes recursos disponíveis e despendidos nos cartórios e tribunais eleitorais, que se encarregariam da execução desse programa de capacitação, sob a supervisão do Ministério da Educação.

 

Muitos opinam que assumir a causa da Declaração Universal dos Direitos Humanos, das Convenções Internacionais que preconizam o voto livre, e a causa das Nações Unidas em favor da educação para a cidadania, não são motivos suficientes para a mudança do regime eleitoral e adoção do voto livre. Reclamam que seria necessário um motivo político mais forte para isso que, evidentemente, além das Diretas já, não existe, haja vista o desvio (papel moderante) de que provém o voto forçado. Na verdade, o motivo político para o voto livre existe sim e data de 1983/84 com a grande mobilização do eleitorado na histórica campanha das Diretas Já, marco fundamental da Abertura Democrática. Aliás, o voto livre deveria ter sido instituído nos anos 80/90, houve projetos no Congresso Nacional que sustentaram essa mudança.

 

Notas

1-Veja o posicionamento do Senado em favor da diminuição do elenco de tais sanções contra o eleitor faltoso (Projeto De Lei Do Senado, Nº 244 de 2006). Na realidade, este projeto pode ser entendido como implicitamente orientado no sentido de um voto obrigatório cujas sanções restringiriam o acesso dos faltosos unicamente aos programas e benefícíos governamentais. Quer dizer, seriam obrigados a votar aqueles que ou integram os serviços públicos, ou participam de políticas públicas, programas do governo e alcançam benefícios ou vantagens de qualquer ordem por este concedidas, em qualquer nível. Fora dessas restrições supostamente razoáveis, o voto seria livre.

2-Quase todos os países que fazem respeitar as leis onde o voto é obrigatório impõem multas. Alguns embaraçam publicamente os eleitores que não votam ou vão até recusar-lhes os serviços e os benefícios de programas governamentais. Nada obstante, há na República Federativa do Brasil nítida extrapolação de competência em relação à lei que estabelece punições aos eleitores faltosos. Ao invés de classificar as sanções com respeito aos direitos civis e políticos protegidos pela Convenção Internacional de 1966 (ICCPR), o regime proíbe aos eleitores faltosos praticar qualquer ato para o qual se exija a quitação do serviço militar ou do imposto de renda. Quer dizer, o eleitor faltoso é concebido e tratado como nocivo à segurança do país.

***

 

 

La Clasificación de Los Derechos Humanos

In cidadania, convenções internacionais, Democracia, desenvolvimento, direitos humanos on May 2, 2016 at 3:35 pm

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La Clasificación de Los Derechos Humanos

Primera, segunda y tercera generación de derechos humanos.

 
LA PRIMERA GENERACCIÓN
Los derechos humanos de primera generación protegen la libertad y la participación en la vida de las democracias. Comprenden fundamentalmente los derechos civiles y políticos. Llamados derechos negativos porque sirven para proteger al individuo contra los excesos del Estado. Incluye, entre otras prerrogativas, la libertad de expresión, la libertad de religión, los derechos de voto y el derecho a un juzgamiento justo. Los derechos humanos de primera generación fueron proclamados por la Declaración de los Derechos de los Estados Unidos (United Estates Bill of Rights, de 15 de diciembre de 1791, incluido en las primeras diez enmiendas de la Constitución), y por la Declaración de los Derechos del Hombre y del Ciudadano, de 1789 en Francia [[i]]. El derecho al debido proceso se remonta como es conocido a los derechos de los ingleses (Magna Carta de 1215). Estos derechos de primera generación fueron consagrados en nivel global y ganó estatus en el derecho internacional, por primera vez, por los artículos 3º a 21º de la Declaración Universal de los Derechos Humanos (Universal Declaration of Human Rights – UDHR, 1948) y más tarde en 1966 por el Pacto Internacional de Derechos Civiles y Políticos (International Covenant on Civil and Political Rights – ICCPR, 1966) [[ii]].
LA SEGUNDA GENERACIÓN
La segunda generación de derechos humanos incluye aquellos relacionados con la igualdad, y empezaran a ser reconocidos por los gobiernos después de la Segunda Guerra Mundial. Son fundamentalmente de naturaleza económica, social y cultural. Garantizan a los diferentes ciudadanos condiciones y tratamiento iguales. Activan la integración del derecho a un nivel de vida adecuado, eses derechos secundarios incluyen el derecho a ser empleado, el derecho a la vivienda, la asistencia médica, así como el derecho a la seguridad social y la ayuda por desempleo. Igual que los derechos de primera generación, también están cubiertos por la Declaración Universal de Derechos Humanos [[iii]] y consagrados respectivamente en sus artículos 22º a 27º. También está defendidos en el Pacto Internacional de Derechos Económicos, Sociales y Culturales (International Covenant on Economic, Social, and Cultural Rights- ICESCR, 1966) [[iv]]. En los EstadosUnidos de América,en enero de 1944, el presidente Franklin D.Rooseveltdefendiólos derechoshumanos relacionados conla igualdad.Del mismo modo,muchasnaciones,estadoso grupos denaciones se handesarrolladodeclaracionesjurídicamente vinculantesque garanticenconjuntosintegralesde los derechoshumanos, como por ejemplola CartaSocialEuropea.Esos derechos contractan el gobierno en sucompromiso derespetarlos,promoverlosy cumpliros, pero eso depende dela disponibilidad de recursos. Se impone eldeberdel estado, ya que controla sus propios recursos.Nadie tiene por si el derechodirecto a la vivienday el derecho ala educación, pero sí “derecho para tener acceso a una vivienda adecuada”, realizadosobre una baseprogresiva.El deberdel gobierno esrealizar estos derechoscomo positivos.
LA TERCERA GENERACIÓN
Latercerageneración de derechos humanosincluyenlosderechos que vanmás allá del contextocivil ysocial. Están proclamados en muchos documentosdel derecho internacional, con énfasis en (a) la Declaración de Estocolmo de1972,proclamada por laConferencia de las NacionesUnidas sobreel Medio Ambiente Humano;(b) laDeclaración de Río de 1992,sobre el Medio Ambientey el Desarrollo.  Estos derechoshan sido difíciles deadoptaren los documentosjurídicamente vinculantes.Las nacioneslíderes de la economía reclaman la soberanía nacional para obstaculizaresta adopción. El términode “tercera generaciónde los derechoshumanos” abriga elamplio espectro de derechos grupales y colectivos, tales como elderecho a la autodeterminación, elderecho al desarrollo económicoy social, el derecho a un medio ambiente sano, el derecho a los recursos naturales, el derecho a se comunicar y a la comunicación, elderecho a participar enel legado cultural, tales os derechos a la equidad intergeneracionaly la sostenibilidad.

 

[i] La Declaración de los Derechos del Hombre y del Ciudadano de 1789 (DDHC) es un documento fundamental de la Revolución Francesa, que formula un conjunto de derechos naturales individuales y las condiciones para su aplicación. Sus últimos artículos han sido adoptadas el 26 de agosto 1789. La Declaración es uno de los tres textos mencionados en el preámbulo de la Constitución francesa de 4 de octubre de 1958. Su valor es reconocido por el Consejo Constitucional desde 1971. Sus disposiciones toman parte del derecho positivo francés y se encuentran en el nivel más alto de la jerarquía de las normas.

[ii] Frente a la “lectura” que equivocadamente relaciona como “participación política “los derechos protegidos en la ICCPR, cabe señalar que la International Covenant on Civil and Political Rights – ICCPR, 1966, (el Pacto Internacional de Derechos Civiles y Políticos – PIDCP) habla de la libertad política y de la sociedad democrática, por lo que se debe entender que los derechos ahí incluidos están especialmente relacionados con la participación en la democracia y en el perfeccionamiento de la sociedad democrática.

[iii] Article 25 UDHR : 1 Everyone has the right to a standard of living adequate for the health and well-being of himself and of his family, including food, clothing, housing and medical care and necessary social services, and the right to security in the event of unemployment, sickness, disability, widowhood, old age or other lack of livelihood in circumstances beyond his control.

2 Motherhood and childhood are entitled to special care and assistance. All children, whether born in or out of wedlock, shall enjoy the same social protection. http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=eng

Artículo 25 UDHR versión: 1. Toda persona tiene derecho a un nivel de vida adecuado que le asegure, así como a su familia, la

salud y el bienestar, y en especial la alimentación, el vestido, la vivienda, la asistencia médica y los servicios sociales necesarios; tiene asimismo derecho a los seguros en caso de desempleo, enfermedad, invalidez, viudez, vejez y otros casos de pérdida de sus medios de subsistencia por circunstancias independientes de su voluntad. 2. La maternidad y la infancia tienen derecho a cuidados y asistencia especiales. Todos los niños, nacidos de matrimonio o fuera de matrimonio, tienen derecho a igual protección social http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=spn

[iv] Article 11 ICESCR

  1. The States Parties to the present Covenant recognize the right of everyone to an adequate standard of living for himself and his family, including adequate food, clothing and housing, and to the continuous improvement of living conditions. The States Parties will take appropriate steps to ensure the realization of this right, recognizing to this effect the essential importance of international co-operation based on free consent.
  2. The States Parties to the present Covenant, recognizing the fundamental right of everyone to be free from hunger, shall take, individually and through international co-operation, the measures, including specific programmes, which are needed: (a) To improve methods of production, conservation and distribution of food by making full use of technical and scientific knowledge, by disseminating knowledge of the principles of nutrition and by developing or reforming agrarian systems in such a way as to achieve the most efficient development and utilization of natural resources; (b) Taking into account the problems of both food-importing and food-exporting countries, to ensure an equitable distribution of world food supplies in relation to need.

http://www.ohchr.org/EN/ProfessionalInterest/Pages/CESCR.aspx

Artículo 11 ICESCR versión

  1. Los Estados Partes en el presente Pacto reconocen el derecho de toda persona a un nivel de vida adecuado para sí y su familia, incluso alimentación, vestido y vivienda adecuados, y a una mejora continua de las condiciones de existencia. Los Estados Partes tomarán medidas apropiadas para asegurar la efectividad de este derecho, reconociendo a este efecto la importancia esencial de la cooperación internacional fundada en el libre consentimiento.
  2. Los Estados Partes en el presente Pacto, reconociendo el derecho fundamental de toda persona a estar protegida contra el hambre, adoptarán, individualmente y mediante la cooperación internacional, las medidas, incluidos los programas concretos, que se necesitan para: a) Mejorar los métodos de producción, conservación y distribución de alimentos mediante la plena utilización de los conocimientos técnicos y científicos, la divulgación de principios sobre nutrición y el perfeccionamiento o la reforma de los regímenes agrarios de modo que se logren la explotación y la utilización más eficaces de las riquezas naturales; b) Asegurar una distribución equitativa de los alimentos mundiales en relación con las necesidades, teniendo en cuenta los problemas que se plantean tanto a los países que importan productos alimenticios como a los que los exportan.

http://www2.ohchr.org/spanish/law/cescr.htm

DÍA DE LOS DERECHOS HUMANOS 2015 – Declaración del Alto Comisionado de las Naciones Unidas para los Derechos Humanos

In Bem-estar, cidadania, convenções internacionais, Democracia, desenvolvimento, direitos humanos, educação, ensino superior, história, history, movimentos sociais, Politics on December 7, 2015 at 11:12 am

DÍA DE LOS DERECHOS HUMANOS 2015

Declaración del Alto Comisionado de las Naciones Unidas para los Derechos Humanos

http://www.ohchr.org/EN/NewsEvents/HRDay2015/Pages/HRD2015.aspx

High Commissioner Video Statement — Human Rights Day 2015 – Spanish version (doc Word)

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En el Día de los Derechos Humanos de este año, quisiéramos que todo el mundo reflexionara sobre el significado de la libertad.

La libertad es el ideal que sustenta lo que ahora reconocemos como el derecho internacional de los derechos humanos, las normas y los reglamentos que protegen y garantizan nuestros derechos.

El Día de los Derechos Humanos de 2015 marca el inicio de una campaña de un año de duración para celebrar el 50º aniversario de dos de los más antiguos tratados de derechos humanos, el Pacto Internacional de Derechos Civiles y Políticos y el Pacto Internacional de Derechos Económicos, Sociales y Culturales.

Ambos documentos, junto con la Declaración Universal de Derechos Humanos, componen la Carta Internacional de Derechos Humanos, que abarca los derechos civiles, culturales, económicos, políticos y sociales, derechos inherentes a todos los seres humanos.

Las libertades proclamadas en estos documentos son universales. Son aplicables a todos los seres humanos, en cualquier parte del mundo. Ni las prácticas tradicionales ni las normas culturales pueden justificar su supresión.

 

Estas libertades abarcan los principios fundamentales: libertad para vivir sin temor y sin miseria, libertad de expresión y de pensamiento, libertad de conciencia y de religión.

El mundo ha cambiado desde que en 1966 la Asamblea General de las Naciones Unidas aprobó los dos Pactos. Estos Pactos, junto con los demás tratados de derechos humanos, han desempeñado una función primordial al fomentar el respeto y el reconocimiento de estos principios en los cinco últimos decenios, periodo que a menudo ha sido convulso.

Por supuesto, todavía debemos afrontar numerosos desafíos. Quienes redactaron esos Pactos difícilmente hubieran podido imaginar retos como los que plantean la intimidad en la era digital, las medidas antiterroristas y el cambio climático, pero el respeto a la libertad sigue siendo el cimiento de la paz, la seguridad y el desarrollo para todos.

Únase a nosotros para celebrar juntos la libertad y ayúdenos a difundir al mundo entero el mensaje de que nuestros derechos y nuestras libertades son inalienables e inherentes, ahora y siempre.

Culturalismo e Sociologia

In dialectics, history, sociologia, sociologia do conhecimento, twentieth century on November 3, 2014 at 6:22 pm

gente_normal

Notas críticas para um estudo dos quadros sociológicos da

Sociologia da compreensão interpretativa desenvolvida por Max Weber.

Por

Jacob (J.) Lumier

 

O culturalismo abstrato ou espiritualista não se presta como orientação intelectual e metodológica para basear os critérios objetivos que permitem construir tipos sociológicos.

 

O culturalismo abstrato é uma corrente de pensamento do século XX que se caracteriza por buscar um elo da filosofia da história com a sociologia. O termo culturalismo é uma expressão utilizada por Georges Gurvitch em seu ensaio sobre “O Objeto e o Método da Sociologia[i] para examinar as orientações limitadoras da sociologia da compreensão interpretativa na obra de Max Weber, esclarecendo sobre a maneira variada como neste último se combinam o formalismo, o culturalismo e o psicologismo que não se sintetizam, mas aumentam continuamente e permanecem desligados uns dos outros.

Atribuindo ao culturalismo abstrato a falta de critérios objetivos e o caráter arbitrário da ligação entre a compreensão e a interpretação subjetiva, Gurvitch põe em relevo que tal orientação errática não se presta para construir tipos sociológicos, já que torna impossível justificar a passagem das significações internas (subjetivas) para as significações sociais e culturais, levando em consequência à dispersão dos critérios.

Por um lado, o culturalismo de Max Weber deriva de sua imensa erudição histórica e, por outro lado, decorre dos preconceitos espiritualistas que reparte com Heinrich Rickert, os quais consistem em considerar todas as ciências sociais como ciências da cultura estritamente individualizantes.

Como assinala Gurvitch, será por esse biais que se chegará a atribuir o papel de fator predominante aos modelos, regras, ideias e valores, levando o culturalismo a um beco sem saída.

 

 

Sumário

A discussão sobre o fator predominante. 1

Compreensão e explicação. 2

A confusão com a filosofia da história. 3

A concepção arbitrária da cultura. 4

Os coeficientes ideológicos. 5

Desencantamento do mundo. 5

Um centro irracional 6

Dualidade Metodológica. 7

Filosofia Existencial 7

Notas de Fim

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A discussão sobre o fator predominante

 

Aliás, a discussão a propósito deste fator predominante na realidade social nos mostra o estado limitado da sociologia do século XIX nos seguintes aspectos: (1) – em sua orientação paradoxal voltada para decompor a realidade social em fatores isolados que precisamente por estarem separados perdem o seu caráter social; (2) – em sua pretensão que visa explicar a realidade social na sua generalidade e fora de seus tipos, recorrendo-se (3) – precisamente ao fator predominante que se acreditava ser ele próprio extra-social.

Portanto, essa crença no caráter extra-social do suposto fator predominante como capaz de explicar a generalidade do social é assinalada em Max Weber, quem nega qualquer possibilidade de intuição do todo social e reconhece em boa vontade o caráter individualista e nominalista de sua concepção da realidade social.

Nota Gurvitch que foi em consequência dessa crença no suposto “fator predominante” que se chegou a falar de escolas sociológicas, cada uma reportando a realidade social assim destruída à outra realidade de outro gênero – geográfica, biológica, tecnológica, psicológica.

O preconceito espiritualista da sociologia do século XIX atribuía às ideias, aos gêneros do conhecimento, às formas do direito um papel determinante, tendo o próprio fundador da filosofia positiva e da sociologia August Comte sucumbido à tentação desse preconceito [ii].

Por sua vez, a ligação dos sociólogos do começo do século XX por cuja orientação se filiam ao preconceito espiritualista é um tanto camuflada. Assim, na Alemanha, partindo de uma analogia com as categorias e os dados sensíveis em Kant, os representantes do culturalismo abstrato dentre os sociólogos afirmam que o Direito constitui a forma enquanto a economia constitui a matéria da realidade social. Ademais fazem com que essa forma, isto é, o Direito, seja tomado como o fator predominante na vida social, pretendendo, em maneira mais ampla, que as formas sociais entendidas por analogia com a filosofia de Kant constituem o único objeto de estudo da sociologia [iii].

 

***

 

Compreensão e explicação

 

Max Weber desconheceu as teorias de consciência aberta às influências do ambiente e veio a tomar as significações práticas dos comportamentos sociais como isoladas da realidade social e sistematizadas pela teologia, pela ciência do Direito, pela filosofia.

Do ponto de vista da crítica pelo realismo sociológico, observa-se que Max Weber não quis separar completamente compreensão e explicação tendo recomendado aos sociólogos, com razão, que, procedendo por compreensão interpretativa, procurassem os sentidos dos comportamentos sociais a fim de melhor os explicar em seguida.

Todavia, a qualificação desses sentidos ou significações como “internas” é o erro que Gurvitch assinala aos adeptos da concepção de que a consciência é voltada para si própria e não aberta às influências diversas da ambiência social (Gestalt).

Aliás, foi dessa maneira que Max Weber desconheceu as teorias de consciência aberta [iv] e veio a tomar as significações práticas dos comportamentos sociais como isoladas da realidade social e sistematizadas pela teologia, pela ciência do Direito, pela filosofia – tal o papel dos fatores predominantes na vida social.

Contudo, se o seu culturalismo tem uma vertente em Heinrich Rickert não chega ao exagero deste, que negava a possibilidade da sociologia como ciência da cultura em virtude da pretensão em generalizar em um domínio onde Rickert supunha que a generalização não seria viável.

Em diferença, os tipos sociológicos ideais weberianos são intermediários entre a generalização e a individualização, e sua generalidade não equivale a uma média, nem sua individualização – que deriva das significações – tampouco é equiparável a uma não-repetição.

 

A confusão com a filosofia da história

 

Do ponto de vista do realismo sociológico, a sociologia exige o abandono das ilusões do progresso em direção a um ideal, bem como o abandono das ilusões de uma evolução social unilinear e contínua.

 

O culturalismo abstrato de Heinrich Rickert deve ser classificado dentre os falsos problemas da sociologia do século XIX, notadamente a falsa alternativa entre sociologia ou filosofia da história, incluindo as obras de todos os que seguiram a Heinrich Rickert de perto ou de longe.

A confusão com a filosofia da história é absolutamente inadmissível, haja vista a capacidade da sociologia para alcançar perfeitamente por si só a situação presente da sociedade sem precisar de outra disciplina para isso.

Mais ainda: a sociologia exige o abandono das ilusões do progresso em direção a um ideal, bem como o abandono das ilusões de uma evolução social unilinear e contínua, sendo da competência da sociologia descobrir na realidade social as diversas perspectivas possíveis e até antinômicas que são postas para uma sociedade em vias de se fazer.

As ilusões trazidas pela confusão com a filosofia da história se encontram favorecidas pela ocorrência de um erro lógico fundamental que é segundo Gurvitch a falta de distinção entre os juízos de realidade e os juízos de valor.

Desse erro decorre a confusão, pois em vez de explicar os desejos a partir da realidade social, constrói-se a realidade social em função desses desejos.

Os juízos de valor são as aspirações, os desejos e as imagens ideais do futuro e formam um dos patamares da realidade social em seu conjunto, de tal sorte que o progresso em direção a um ideal só pode intervir na análise sociológica unicamente em vista de integrar esse progresso ideal em um conjunto de fatos sociais que a análise se propõe explicar.

A sociedade está sujeita a flutuações e até aos movimentos cíclicos e o progresso retilíneo em direção a um ideal particular, tomado como um movimento constante, não pode valer mais do que para períodos determinados – em outros períodos a sociedade pode até avançar para uma direção oposta ao ideal ou orientar-se por um ideal completamente diferente.

 

A falta de distinção entre os juízos de realidade e os juízos de valor torna impossível o acesso da análise sociológica a um dado fundamental da vida social que é a variabilidade.

 

Quer dizer, a falta de distinção entre os juízos de realidade e os juízos de valor [v] torna impossível o acesso da análise sociológica a um dado fundamental da vida social que é a variabilidade. Gurvitch nos lembra que a identificação da sociologia e da filosofia da história afirma a pressuposição monista que é absolutamente irreal, pois não existe uma Sociedade com “S” maiúsculo, mas só há unicamente sociedades múltiplas, em tal sorte que o sociólogo é levado a pôr em relevo em cada sociedade a ocorrência de tendências variadas, e em cada crise o anúncio de diversas soluções possíveis.

O termo realidade social e o termo sociedade cobrem fenômenos muito diferentes segundo se trate de diferentes épocas históricas, de diferentes civilizações, de diferentes tipos sociais. Uma visão singular da sociedade e um modo próprio de interpretar sua natureza são manifestações de caráter coletivo que se encontram em cada tipo de sociedade global.

Ora, o culturalismo abstrato articula uma concepção sem nenhum contato com essas manifestações do real concreto.

Trata-se de uma orientação desdobrada da chamada filosofia crítica da história que se tentou opor à filosofia dogmática da história. Todavia, a metodologia do saber histórico veio a ser discutida sem ter sido posta em relação dialética com a metodologia do conhecimento sociológico, nem ter afirmado o reconhecimento da realidade dos fenômenos do todo social – ou fenômenos sociais totais, no dizer de Gurvitch.

 

A concepção arbitrária da cultura

 

►Daí que, no culturalismo, o objeto e a realidade histórica tiveram que brotar do próprio método histórico. Com tal desiderato, Heinrich Rickert e seus colegas de pesquisa (inclusive Max Weber) utilizaram a noção de cultura.

Ou seja, a noção de cultura veio a ser identificada a alguns fatos e alguns valores arbitrariamente escolhidos, na convicção de que cultura se opõe a natureza.

Para esses culturalistas, a distinção entre natureza e espírito deve ser aplicada positivamente à caracterização das ciências históricas. Por sua vez, estas tratam de objetos que são portadores do espírito objetivo, quer dizer, objetos que possuem um significado e um sentido não perceptível, mas compreensível para todos.

Isto se esclareceria de imediato – supõe-se no culturalismo – se pensarmos que a história é antes de tudo ciência da cultura humana.

Quer dizer, a vida cultural se apresentaria sempre como um acontecimento significativo e pleno de sentido, enquanto a natureza, por contra, se desenvolveria livre de significado e de sentido, chegando-se inclusive a censurar Dilthey exatamente por não ter desenvolvido a oposição entre natureza e espírito em uma lógica da história.

No esquema do culturalismo abstrato, Gurvitch destaca que (1) – é por meio dessa referência aos valores como método (alguns valores arbitrariamente escolhidos) que se constrói a cultura (o objeto e a realidade histórica tiveram que brotar do próprio método histórico); (2) – para o estudo da cultura assim construída em manifestações ou fatos individualizados, só se poderia aplicar unicamente o método individualizante (repelindo a tentativa de generalizar as situações particulares em tipos sociológicos concretos); (3) – desta maneira, se obteria por resultado, conjuntamente, a realidade histórica e a ciência da história.

Tal é o esquema do culturalismo abstrato em sua tentativa de reduzir toda a história a uma história da cultura, procedendo por um método sobre outro método.

***

 

A crença no caráter extra-social do fator predominante como capaz de explicar a generalidade do social funciona para equilibrar a tensão no pensamento de Max Weber sem que, todavia, isso o proteja contra os reveses em sua sociologia, como a dispersão.

 

Os coeficientes ideológicos

 

Neste ponto podemos pôr em relevo que essas análises e apreciações críticas em torno ao culturalismo abstrato podem aportar algum esclarecimento não só à história das ciências sociais no século XX, mas notadamente ao estudo sociológico dos quadros de referência da própria sociologia – a sociologia do conhecimento sociológico – que Gurvitch considera indispensável para liberar a sociologia de certos coeficientes ideológicos.

No caso em pauta, trata-se do estudo dos quadros sociológicos da sociologia da compreensão interpretativa desenvolvida por Max Weber. Essa linha de pesquisa já se encontra assinalada nos estudiosos da obra e pensamento de Max Weber que buscam selecionar as influências aceites por este pensador oriundas do seu ambiente social e intelectual mais próximo, assim como buscam descobrir a maneira pela qual tais influências se traduzem em conceitos e modelos de análise.

A sugestão de que o problema da sociologia de Max Weber se equaciona em termos sociológicos em torno ao culturalismo espiritualista, tomado como o conjunto das orientações intelectuais e metodológicas que servem de referência para a sociologia da compreensão interpretativa, parece atender em maneira bastante satisfatória a tal linha de pesquisa dos estudiosos.

Isto porque tal sugestão aporta um esclarecimento sobre as fontes na sociologia do século XIX para a procedência do formalismo, do culturalismo e do psicologismo que, frequentemente, os estudiosos observam combinando-se em maneiras variadas na sociologia de Max Weber.

►Como vimos, a análise de Gurvitch nos mostra que essas orientações para o formalismo, o culturalismo e o psicologismo nada mais significam do que ampliações da crença no caráter extra-social do fator predominante como capaz de explicar a generalidade do social.

A dificuldade maior de Max Weber surge da tensão entre, por um lado, a convicção de que o método das ciências sociais é necessariamente individualizante e por outro lado a própria possibilidade da sociologia, a qual implica em generalização. Tal o quadro do seu pensamento, que Gurvitch põe em relevo como se efetivando na base da construção dos tipos sociológicos ideais.

Por outras palavras: a crença no caráter extra-social do fator predominante como capaz de explicar a generalidade do social funciona então para equilibrar essa tensão no pensamento de Max Weber sem que, todavia, isso o proteja contra os reveses em sua sociologia, como a dispersão.

 

Desencantamento do mundo

 

Como se sabe, o contexto mais amplo em que se produziu a sociologia da compreensão interpretativa é marcado não só pela atmosfera humanista dos salões intelectuais, mas pela influência dos neokantianos, que predominaram nas universidades alemães à época do liberalismo, entre 1870 e 1914, acentuando a erudição no ensino e a importância dos conceitos reguladores e das regras como princípios na teoria do conhecimento.

Além disso, nota-se também o choque de duas estruturas de trabalho intelectual contemplando no dizer de C. Wright Mills a interpretação conservadora de ideias pelos acadêmicos, por um lado e, por outro lado, a produção intelectual de socialistas não-acadêmicos (Kautsky, Bernstein, Mehering), dualidade esta que criava uma tensão intelectual singular e desafiadora.

Em comentário que corrobora a crítica por Gurvitch, Wright Mills observa a confusão em Max Weber da filosofia da história e da sociologia. A racionalização não só é um princípio, mas é o elemento mais geral na filosofia da história de Max Weber, sendo medida pelo desencantamento do mundo, em relação a que Wright Mills situa a contribuição de Max Weber à sociologia o conhecimento, ao mesmo tempo em que registra tratar-se da concepção errática de um progresso unilinear na direção da perfeição moral.

Mas não é tudo. Em relação ao psicologismo, Wright Mills nota que a noção de cultura europeia em Max Weber afirma igualmente o progresso ideal, porém admitindo ambiguidades, e que as racionalizações progressivas são objetos de análises psicológicas quando ali se trata de explicar os sistemas religiosos.

Sublinha igualmente Wright Mills o nominalismo cuidadoso do método de Max Weber e a influência da imagem (romântica) do indivíduo monumentalizado (Carlyle) para a concepção weberiana do líder carismático.

Um centro irracional: a personalidade

 

Nesse individualismo nominalista, se a unidade final das análises weberianas é posta pelas motivações compreensíveis do indivíduo isolado, não será de espantar que essa análise estanque ou fique suspensa diante do conceito de personalidade.

Com efeito, a personalidade ali não passa de um centro de criatividade profundamente irracional, um processus não analisado cuja concretização em uma noção derivada do romantismo como a monumentalização do indivíduo Max Weber se empenha em rejeitar (em que pese a influência efetiva de Carlyle).

  • Esse individualismo e nominalismo podem ser notados diretamente na seguinte passagem selecionada por Wright Mills de “Ensaios sobre a Teoria da Ciência” de Max Weber (Ver a edição francesa: Paris, Plon): “A sociologia interpretativa considera o indivíduo (Einzelindividuum) e seu ato como a unidade básica, como seu átomo (…). O indivíduo é também o limite superior e o único portador de conduta significativa (…). Conceitos tais como: Estado, associação, feudalismo e outros semelhantes designam certas categorias da interação humana. Daí ser tarefa da sociologia reduzir esses conceitos à ação compreensível, isto é, sem exceção, aos atos dos indivíduos participantes[vi].

Para W. Mills, o problema da compreensão foi formulado por Wilhelm Dilthey e Max Weber o incorporou em suas análises por ele mesmo denominadas como sociologia interpretativa ou compreensiva.

O problema dos tipos sociológicos atenderia, pois, a uma abordagem nominalista e estabeleceria uma escala de racionalidade e irracionalidade, em que a psicologia da motivação cede lugar a um recurso tipológico.

 

Dualidade Metodológica

 

  • Wright Mills sustenta a ocorrência de uma dualidade envolvendo as reflexões metodológicas e as análises de Max Weber. Por um lado, houvera o propósito metodológico de limitar a compreensão e interpretação do significado às intenções subjetivas do agente social, mas em sua obra real, por outro lado, Max Weber teria admitido que os resultados das interações em modo algum se mostrariam sempre idênticos ao que o agente pretendia fazer.

Apesar de todas essas observações direcionadas para uma sociologia do conhecimento sociológico, Wright Mills não percebe, porém, a importância da utilização de fatores isolados na sociologia interpretativa weberiana.

Ou seja, a utilização de fatores isolados na sociologia de Max Weber é constatada sim por Wright Mills. Todavia, por falta de uma crítica da sociologia do século XIX, esse autor ali não percebe o influxo da crença no caráter extra-social do fator predominante como capaz de explicar a generalidade do social, nem o alcance desta crença, específica aos sociólogos do século XIX, para a análise sociológica dos quadros intelectuais da sociologia de Max Weber.

 

Filosofia Existencial

 

►Em maneira semelhante a Wright Mills, outros autores estudiosos também se restringem a assinalar uma correlação entre um contexto de choque de duas estruturas de trabalho intelectual por um lado, e por outro lado a dualidade entre metodologia e análise na obra de Max Weber. Lamentavelmente, não desenvolvem orientação proveitosa em sociologia do conhecimento sociológico aplicável a este pensador.

Assim Raymond Aron tece suas observações críticas no âmbito desse duplo dualismo de influências intelectuais e de metodologia/análise e, embora admita a influência de Heinrich Rickert, também se apraz em contemplar o irracional em Max Weber.

Mais precisamente: tendo descoberto uma orientação de caráter existencial ou até existencialista na filosofia implícita de Max Weber, Raymond Aron limitou sua contribuição a uma forte argumentação contra a redução do pensamento weberiano ao nihilismo – tese sustentada pelo filósofo da cultura política Leo Strauss.

Nesse marco de crítica filosófica, e em certo modo inesperado para um sociólogo, nos sugere Raymond Aron que o problema da compreensão tal como desenvolvido em Max Weber deve ser referido preferencialmente não a Dilthey, mas ao pensamento metapsicológico do psiquiatra e filósofo kierkegaardiano Karl Jaspers.

Quer dizer, deve-se dar preferência ao psicologismo ou à limitação de Max Weber ao psicologismo, fazendo prevalecer o âmbito não romântico do problema daquele centro de criatividade profundamente irracional, que como vimos Wright Mills acentuou a respeito da orientação de Max Weber para o conceito de personalidade.

Desse modo, em um dos seus primeiros ensaios marcantes intitulado “Introduction à la Philosophie de l’Histoire” (Paris, Gallimard) Raymond Aron sublinha a separação radical do fato e dos valores em Max Weber, desdobrando alguns comentários críticos a respeito do paradoxo em se ignorar nos seres do passado a vontade de valor ou de verdade, paradoxo este limitando em consequência o alcance da orientação de Max Weber para a compreensão da conduta individual unicamente na referência das ideias de valor [vii] .

Sustenta esse estudioso que se essa concepção excluindo a vontade de valor ou de verdade fosse admitida, não se teria o critério para diferenciar entre uma obra de filosofia como a “Crítica da Razão Pura”, de E. Kant, e o que Raymond Aron chama as imaginações delirantes de um paranoico, já que ambas seriam colocadas no mesmo plano [viii].

Seja como for, esse estudioso não chega a observar em tal exorbitância do método nominalista o desvio ideológico (biais) pelo qual se infiltra no pensamento de Max Weber a crença específica que acometia os sociólogos do século XIX e que deve ser posta de lado como prejudicial, pela qual se reduz como vimos a realidade social aos fatores predominantes, a saber: a crença no caráter extra-social do fator predominante como capaz de explicar a generalidade do social.

Assim, em seu monumental ensaio posterior sobre “Les Étapes de La Pensée Sociologique[ix] , Raymond Aron se limitará a confirmar que a orientação de Max Weber deve ser referida a uma filosofia existencial, nada acrescentando de interesse para a análise dos quadros sociológicos da sociologia da compreensão interpretativa desenvolvida por Max Weber. Desta sorte, embora acentue a vinculação da sociologia interpretativa aos limites do século XIX, o que prevalece é a mencionada conclusão de Gurvitch, de que a crença no caráter extra-social do fator predominante como capaz de explicar a generalidade do social funciona para equilibrar a tensão no pensamento de Max Weber, sem que, todavia, isso o proteja contra os reveses em sua sociologia, tais que a dispersão.

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Este artigo “Culturalismo e Sociologia: Notas críticas para um estudo dos quadros sociológicos da Sociologia da compreensão interpretativa desenvolvida por Max Weber” é um  trecho do eBook CULTURA E CONSCIÊNCIA COLETIVA: Leituras Saint-simonianas de Teoria Sociológica – Nova Formatação, elaborado e modificado em 2007 – 2009,  publicado na Web da OEI

Editado pelo Websitio Produção Leituras do Século XX – PLSV: Literatura Digital http://www.leiturasjlumierautor.pro.br

© 2007 Jacob (J.) Lumier

Veja também Cultura e Objetividade: Primeira Parte: Max Weber
 
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Notas de Fim

 

[i] Ver Gurvitch, Georges: “Objeto e Método da Sociologia”, in Gurvitch et al.: “Tratado de Sociologia-vol.1“, trad. Ana Guerra, revisão: Alberto Ferreira, Porto, Iniciativas Editoriais, 1964, pp.15 a 50, 2ªedição corrigida (1ªedição em Francês: Paris, PUF, 1957). Ver também do mesmo autor e nessa mesma obra coletiva: “Breve Esboço da História da Sociologia”, trad. Rui Cabeçadas, pp.51 a 98. Ver também do mesmo autor: “A Vocação Actual da Sociologia – vol. I: na senda da sociologia diferencial”, tradução da 4ª edição francesa de 1968 por Orlando Daniel, Lisboa, Cosmos, 1979, 587pp. (1ªedição em Francês: Paris, PUF, 1950).

[ii] Comte viu no conhecimento teológico, no conhecimento metafísico, no conhecimento positivo os fatores decisivos do desenvolvimento da sociedade.

[iii] No culturalismo abstrato as formas sociais são aparentadas em sua primazia às enteléquias aristotélicas, como causas ao mesmo tempo finais e eficientes. Cabe notar que Gurvitch estuda na referência da “escola espiritualista” os sociólogos alemães R. Stammler, por um lado, e por outro lado Simmel, Vierkandt, e Von Wiese.

[iv] As teorias de consciência aberta foram desenvolvidas por Bergson, por Husserl, por Bachelard e promovidas nos meios sociológicos por Gurvitch como levando à constatação da imanência recíproca do individual e do coletivo. Ver Gurvitch, Georges (1894-1965): “Dialectique et Sociologie”, Flammarion, Paris 1962, 312 pp., Col. Science.

[v] Não confundir com a “separação radical do fato e dos valores”, que alguns autores assinalam na base da redução das condutas individuais às ideias de valor, tal como preconiza Max Weber, decorrendo dessa redução a mencionada falta de distinção entre os juízos de realidade e os juízos de valor.

[vi] Wrigth Mills, C. E Gerth, Hans – Organizadores: « Max Weber : Ensaios de Sociologia », tradução Waltensir Dutra, revisão Fernando Henrique Cardoso, 2ªedição, Rio de Janeiro, Zahar, 1971, 530 pp.(1ªedição em Inglês : Oxford University Press, 1946).

[vii] Na medida em que as ideias de valor referem igualmente a sociologia da religião de Max Weber, caberia notar o contraste com as análises dialéticas da ambiência histórica tradicional e religiosa desenvolvidas por Ernst Bloch que, enlaçando a vontade de valor e de verdade ao elemento essencial originário em si mesmo, reintegra nos seres do passado a impaciente, rebelde e severa vontade de paraíso Cf. Bloch, Ernst: Thomas Münzer, Teólogo de la Revolución (“Thomas Münzer als Theologe der Revolution”, München 1921) Editorial Ciencia Nueva, Madrid, 1968, págs.67, 68. Ver Lumier,Jacob(J.): “O Tradicional na Modernização: Leituras sobre Ernst Bloch“, Internet, E-book pdf 130 págs., Web da OEI, http://www.oei.es/cienciayuniversidad/spip.php?article277

[viii] Desta sorte, a prostituição é um fenômeno cultural tanto quanto a religião ou o dinheiro – nos dirá Weber em seu relativismo culturalista.  Portanto, nessa argumentação se acentua que  a condicionalidade pelas ideias de valor  é proposta na referência do uso pelos lógicos modernos: os fenômenos culturais são tais unicamente para a razão e unicamente porquanto sua existência e a forma que assumem historicamente tocam diretamente ou indiretamente aos nossos interesses culturais e científicos.

[ix] ARON, Raymond: “Les Étapes de la Pensée Sociologique : Montesquieu, Comte, Marx, Tocqueville, Durkheim, Pareto, Weber”, Paris, Gallimard, 1967, 659pp.

Cultura e Objetividade _ Primeira Parte: Max Weber

In dialectics, history, sociologia, sociologia do conhecimento, twentieth century on October 29, 2014 at 10:02 pm

 

Cultura e Objetividade:

Notas sobre Max Weber e Wilhelm Dilthey

Jacob (J.) Lumier


PRIMEIRA PARTE: MAX WEBER

Continuação do Post Cultura e Objetividade: Preliminares

 

 

 “Cultura é um segmento de significação que permanece irredutível à natureza e qualquer proposição de retorno à natureza é absolutamente contrária a uma civilização concreta”. (Max Weber)

 

Sumário

 

A possibilidade de um conhecimento do cultural 4

Ideias de valor e significação. 6

Análise da racionalização. 7

Racionalização e a Renascença. 8

Arte e Ciência. 8

O humanista da Renascença. 9

A ordem simbólica e os grupos de status 10

Culturalismo espiritualista. 11

Comentário Anexo

Notas de Fim

 

 

A possibilidade de um conhecimento do cultural

 Dentre os pensadores do início do século XX, é com Max Weber que se consagrou a noção de cultura no âmbito da sociologia como sendo algo mais do que um modelo social. Em sua notável obra “A Objetividade do Conhecimento”, a noção de cultura aparece na sequência de uma argumentação rejeitando qualquer mérito ao estudo que se pretenda objetivo dos eventos culturais e que seja voltado para efetuar a redução da realidade empírica ao plano das leis de explicação.

Max Weber reconhece a equiparação entre os eventos culturais e os fenômenos de ordem mental. Não obstante isso toma por pouco relevante a proposição de que a insuficiência de uma redução da realidade empírica a leis causais sociais possa decorrer em razão do baixo grau de legalidade ou regularidade desses fenômenos mentais.

Acrescenta o seguinte: 1) – que o conhecimento das leis sociais não é um conhecimento da realidade social, mas é um meio utilizado pelo pensamento em vista de tal efeito; 2) – que o conhecimento dos eventos culturais se funda na significação que a realidade da vida possui aos nossos olhos, sendo essa realidade sempre estruturada de maneira singular bem como são igualmente singulares as relações em que a realidade aparece aos nossos olhos como dotada de significação; 3) – que, estando vedado a qualquer lei de explicação causal revelar o sentido e as condições em que é possível conceber um conhecimento dos eventos admitidos como culturais, é, por contra, aceite por Max Weber que este problema se decide em virtude das ideias de valor.

Quer dizer, a possibilidade de um conhecimento do cultural depende dessas ideias de valor, já que é sob essas ideias especiais que a cultura nos casos particulares vem a ser cada vez considerada por Nós-outros ([i]).

Esse segmento de significação – a cultura – permanece assim irredutível e não admite nenhum retorno originário à natureza, sendo a proposição deste retorno à natureza absolutamente contrária a uma civilização concreta. Quer dizer, Max Weber argumenta contra um interlocutor imaginário, supondo-o defensor do retorno à natureza ([ii]) e o faz com a finalidade de pôr em relevo a reciprocidade das ideias de valor, a que se liga sua definição.

A cultura resta um segmento de significação, pois o defensor do retorno à natureza só pode adotar essa atitude referindo a civilização concreta, à qual ele se opõe, às suas próprias ideias de valor, sendo estas, por sua vez, que lhe fazem encontrar aquela fútil.

Trata-se na cultura, ou nesta definição Weberiana de cultura, uma condição puramente lógica e formal, como ele próprio o declara. Condição esta que seria visada ao se dizer que todas as individualidades históricas são ancoradas de maneira logicamente necessária nas ideias de valor.

Mas não é tudo. Essa definição da cultura em casos particulares, como segmento de significação baseado na reciprocidade das ideias de valor, aparece como decisiva para a conclusão de Max Weber, afirmando a pressuposição transcendental de toda a ciência da cultura, a respeito da qual esse autor nos dirá consistir no fato de os Nós-outros dos homens afirmarem-se como seres civilizados, dotados da capacidade e da vontade de tomar conscientemente posição em face do mundo e lhe atribuir um sentido.

Nos seus esclarecimentos complementares, é-nos dito que é com base nesse sentido atribuído, seja lá qual for, que alguém é conduzido a portar os ajuizamentos sobre certos fenômenos da coexistência humana, a respeito dos quais, segundo Max Weber, também se é conduzido a tomar uma posição significativa, que tanto pode ser positiva ou negativa.

 

Ideias de valor e significação

Nessas formulações se vê então não só o estabelecimento de uma ligação conceitual entre as noções de seres civilizados, posição, atribuição de sentido, mas essa ligação surge como o que efetivamente esclarece sobre a definição de cultura, como condição puramente lógica e formal, dando-lhe uma dimensão transcendental ou permitindo opor em termos absolutos uma civilização concreta à veleidade de regresso à natureza.

Daí, qualquer que seja o conteúdo da tomada de posição significativa, os fenômenos da coexistência humana seriam tais porque teriam aos nossos olhos uma significação cultural. Ademais, o que Max Weber chama condicionalidade do conhecimento cultural pelas ideias de valor reflete o alcance da significação cultural como o que funda o interesse científico de tais fenômenos, à exclusão do caráter de que sejam fenômenos puramente notáveis.

Desta sorte, a prostituição é um fenômeno cultural tanto quanto a religião ou o dinheiro – nos dirá Weber em seu relativismo culturalista.  Portanto, nessa argumentação se acentua que a condicionalidade pelas ideias de valor é proposta na referência do uso pelos lógicos modernos: os fenômenos culturais são tais unicamente para a razão e unicamente porquanto sua existência e a forma que assumem historicamente tocam diretamente ou indiretamente aos nossos interesses culturais e científicos.

Em termos operativos, a definição de cultura é desdobrada nos critérios do fenômeno cultural como instigando nossa curiosidade intelectual, já que essa curiosidade procede igualmente dos pontos de vista das ideias de valor, sendo estas que, enfim, imprimem uma significação ao segmento de realidade entendido sob os conceitos de prostituição, religião ou dinheiro.

Quanto à noção de civilização, compreende a mesma o campo dos fenômenos da coexistência humana, haja vista falar-se de uma civilização concreta, ou melhor, no sentido Weberiano, “civilização particular”.

 

Análise da racionalização

 Com referência à análise da racionalização e em especial no tocante à Renascença, a utilização aplicada do termo “cultura” em Max Weber se diferencia em certo aspecto da religião, já que “afirma a noção de bens de civilização sem alcance religioso imediato”.

Com efeito, Max Weber ganhou o prestígio de um mestre da sociologia em virtude de notável influência de suas análises da civilização ocidental, cujo fenômeno peculiar examinou na racionalização, por vezes associada à noção de intelectualização, mas que compreendeu em definitivo como o resultado da especialização científica e da diferenciação técnica, no dizer do Weberianista Julien Freund.

Essa racionalização consiste na organização da vida por divisão e coordenação das diversas atividades com base em estudo preciso das relações entre os homens e das relações com seus instrumentos e seu meio, visando maior eficácia e rendimento. Max Weber teria ainda caracterizado essa racionalização como um refinamento engenhoso da conduta e um domínio crescente do mundo exterior analisando-a em sua evolução através da religião, do direito, da arte, da ciência, da política e da economia.

Sob o aspecto da intelectualização progressiva da vida, a racionalização despoja o mundo de seus encantos e de sua poesia: é desencanto. O mundo se torna como a obra artificial do homem, que o governa como se comanda a uma máquina. Julien Freund nos lembra certa afinidade de Max Weber com Jacob Burckhardt, quem pôs em relevo a racionalidade na Renascença dando ênfase à perspectiva em arte e simbolizando o Estado constituído pelas cidades italianas livres como obra de arte.

 

Racionalização e a Renascença

 De fato, na sua influente e polêmica obra “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo“, Max Weber inicia com uma série de observações sobre a racionalização na civilização ocidental, destacando o legado da Renascença neste particular, já que o método experimental é um produto da Renascença, sem o qual nem a medicina teria fundamento biológico e bioquímico, apesar de utilizar uma técnica empírica avançada, pois uma química racional só veio a se conhecer na civilização ocidental.

Mas não é tudo. Nessa mesma obra Max Weber lembra-nos novamente a Renascença quando o assunto é o aparecimento da música racionalmente harmônica – contraponto e harmonia – ou a própria racionalização tida hoje por clássica da arte no seu conjunto, notando em pintura a utilização racional da perspectiva.

Além disso, a cultura da Renascença tem em Max Weber uma referência de destaque em sua análise do ascetismo racional.

Quer dizer, ao observar que nas polêmicas teológicas se dava mostra de erudição e alusões clássicas, assinala o ideal do puritano como não implicando desprezo pela cultura, ainda que se verificassem tomadas de posição desconfiadas ou até hostis aos bens de civilização sem alcance religioso imediato.

O ideal do puritano em relação à cultura acolhe de bom grado a ciência, fazendo exceção da escolástica.

Podemos então registrar nessa passagem, com referência à análise da racionalização e em especial no tocante à Renascença, que o uso aplicado do termo cultura em Max Weber se diferencia em certo aspecto da religião já que afirma a noção de bens de civilização sem alcance religioso imediato.

Noção esta que, compondo uma imagem da Renascença como foco do moderno, Max Weber tornará a frisar em suas célebres conferências sobre “Le Savant et le Politique”, sobretudo o alcance da experimentação racional tornando possível a ciência empírica moderna: no seu dizer foi a Renascença que elevou a experimentação ao estatuto de um princípio da pesquisa como tal.

 

Arte e Ciência

 Antes de passar às ciências, esse procedimento encontra paralelo no domínio da arte, com Leonardo da Vinci e seus pares e, em maneira característica, no domínio da música como dissemos, em que Max Weber homenageia os “experimentadores do cravo” no século XVI, tendo sido sob a influência de Galileu que esse procedimento de experimentação controlada se torna o grande instrumento da atividade científica – estendendo-se ao campo da teoria com Bacon para ser adotado nas universidades, sobretudo em Itália e nos Países Baixos.

No pórtico dos tempos modernos a ciência aparecia aos olhos dos homens da Renascença como o caminho que conduz à arte verdadeira, interpretado por Max Weber como o caminho que conduz à verdadeira natureza.

Quer dizer, esse autor nos sugere ter sido essa ligação entre arte e ciência, ambas procedendo da mesma ideia de Natureza como acessível à experimentação, que está na base da convicção renascentista elevando em ideal e em realidade o artista ao nível de um homem douto. Fato este observado na sociedade da Renascença, onde os artistas assumiam por eles mesmos essa convicção e onde a ambiência social lhes reservou um lugar de prestígio.

 

Se a incredulidade moderna é tirada do culto da Renascença pelos heróis, lembrando-nos inclusive o florentino Maquiavel, Max Weber nega que o problema da ética seja um apanágio dessa mesma Renascença.

 

O humanista da Renascença

Mas não é tudo. A afinidade de Max Weber com Jacob Burckhardt pode ser acompanhada na revalorização dos humanistas, na utilização da imagem positiva destes por Max Weber que, em suas análises dos tipos sociais dos letrados, alerta-nos para o humanista da Renascença, não só como paradigma de um tempo onde se aprendia a fazer discursos em latim e poesias em grego a fim de se tornar conselheiro político e historiógrafo de um príncipe, mas também como caracterizando um fino letrado que recebeu uma educação humanista ao entrar em contato com os monumentos linguísticos do passado longínquo.

Há outras passagens em que a imagem da Renascença como foco do moderno serve de apoio a Max Weber para contrarrestar sua análise da especialização da ética como favorecendo a organização da política em atividade perfeitamente consequente, submetida às suas próprias leis e sempre mais consciente dela mesma.

Quer dizer, se a incredulidade moderna é tirada do culto da Renascença pelos heróis, lembrando-nos inclusive o florentino Maquiavel, Max Weber nega que o problema da ética seja um apanágio dessa mesma Renascença. Tanto que sua análise da especialização da ética é comparativamente referida ao quadro de conjunto de todas as religiões.

 

A ordem simbólica e os grupos de status

►Retornando aos aspectos metodológicos da noção de cultura e da utilização aplicada da mesma pode-se observar em Max Weber e em sua obra monumental “Economia e Sociedade” certa equiparação da noção de cultura à ordem simbólica. É o que nos sugere Pierre Bourdieu ao nos mostrar que, na análise Weberiana da assim chamada “ordem propriamente social”, todos os traços atribuídos ao grupo de status pertencem à ordem simbólica.

Por cultura se compreenderia, então, o conjunto das convenções portadas pelos grupos desse tipo nas sociedades tradicionais ou a exemplo dessas sociedades.

Tratar-se-ia de uma noção utilizada na descrição da funcionalidade desses grupos de status e de sua influência e que incluiria, portanto, além de modelos de comportamento, as regras convencionais que definem a maneira justa de executar os modelos.

Segundo esse autor, na análise da assim chamada “ordem propriamente social” Max Weber atribui a cada grupo de status como camponeses, burocratas, guerreiros, intelectuais certas propriedades que Bourdieu chama trans-históricas ou transculturais tais como certa atitude diante do mundo ou certo tipo de religiosidade. Desta forma a cultura como ordem simbólica inclui um estilo de vida ou de privilégios honoríficos – por exemplo: o uso de vestimentas características, o consumo de iguarias específicas proibidas a outros, o direito de se dedicar a práticas artísticas, etc. – bem como as regras e proibições que regulam certas trocas sociais como dentre outras o casamento.

Segundo Bourdieu, a funcionalidade dessa noção mais etnológica de cultura a que já nos referimos (ver nota “1”) está em acentuar a autonomia parcial da ordem social em relação à ordem econômica, já que tal autonomia deriva da possibilidade inerente à ordem social para desenvolver a sua própria lógica como universo de relações simbólicas – definindo-se esta ordem como modo de distribuição do prestígio social.

Bourdieu nos sugere que o aproveitamento da noção de cultura em Max Weber conduz ao conceito de certa lógica da simbolização da posição social que, nessa linha de interpretação, é equivalente à lógica da estrutura social, posto tratar-se de uma lógica da distinção.

Neste ponto pode-se notar que o aproveitamento dessa noção mais etnológica de cultura baseia-se em simplificações e atribuições perfeitamente arbitrárias, com o sistema social sendo reduzido a uma lógica da inclusão e da exclusão sem referência aos quadros sociais específicos e valendo em maneira abstrata para qualquer estrutura social, como se as lógicas sociais não sofressem variações em função de quadros sociais precisos e dos tipos de sociedades globais, como se aprende com Durkheim e seus colaboradores ([iii]).

 

Culturalismo espiritualista

Sem dúvida, essa orientação abstrata revela a dificuldade própria ao aproveitamento da noção de cultura em Max Weber impregnada do neokantismo e da filosofia da história de Heinrich Rickert, tanto que Georges Gurvitch situa Max Weber na confusa e equivocada corrente do culturalismo espiritualista, pondo em relevo tal dificuldade.

Os pré-conceitos espiritualistas intervindo indevidamente no âmbito da sociologia consistem não só em considerar todas as ciências sociais como ciências da cultura, mas são igualmente afirmados lá onde se atribui aos modelos, regras, ideias e valores o papel de fatores predominantes, estabelecendo as significações internas das condutas sociais como ligadas às significações e valores culturais, de tal sorte que um lugar proeminente na sociologia vem a ser concedido às sistematizações das significações culturais feitas pelos teólogos, juristas, moralistas, etc.

Gurvitch sublinha que no culturalismo de Max Weber a sociologia da religião, do Direito, etc. deve limitar-se ao estudo das repercussões unilaterais dos encadeamentos dos dogmas, das normas, dos valores – elaborados por ciências sociais particulares – sobre as condutas sociais que os realizam, relegando o problema das correlações funcionais recíprocas para um nível implícito ([iv]).

Nessa crítica, a dificuldade maior no aproveitamento da sociologia de Max Weber é sua incapacidade para apreender as totalidades concretas e não ver que a compreensão e a explicação são apenas momentos do mesmo processus, a tipologia qualitativa não podendo ser aplicada no vazio, mas exigindo apreender a sociedade, os grupos, as classes, os Nós-outros, bem como as suas obras diretas [v].

 

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Comentário Anexo

 

Segundo GURVITCH, o balanço da definição oferecida por Max WEBER do objeto e do método da sociologia mostra que este autor amargou alguns reveses. Eis sua definição: “A sociologia é uma ciência da cultura que investiga os tipos ideais das oportunidades das condutas individuais que têm um caráter social, das quais estuda as significações internas e as significações culturais, procedendo pela compreensão interpretativa e atingindo, desse modo, a explicação causal das suas realizações nas condutas” (apud GURVITCH: “Tratado de Sociologia, vol. I”, pp.31-33).

Em seu comentário, GURVITCH concede que Max WEBER descobre o método tipológico ao fazer frente à objeção de que a sociologia, como ciência da cultura, estaria prejudicada por agasalhar a pretensão de generalizar num domínio onde a generalização não seria viável.

Os “tipos” são construídos conscientemente com base na compreensão interpretativa dos “sentidos de condutas” (donde derivam os “valores”), de início “sentidos internos”, mas que, no desdobramento, se juntam às significações culturais. Portanto, os tipos não são considerados nem como espécies biológicas, nem como fases do desenvolvimento histórico, nem como essências fenomenológicas.

Esses tipos descobertos por Max WEBER são intermediários entre a generalização e a individualização. E GURVITCH esclarece: a sua generalidade nada tem contudo a ver com a média; a individualização, derivando das significações, não se identifica a uma não-repetição, sendo os “sentidos internos” ou subjetivos mais individualizados do que os sentidos cultura.

Quer dizer, os tipos ideais Weberianos, como elaborações especiais caracterizando os sociólogos, são “imagens mentais” obtidas, no dizer de GURVITCH, por “racionalizações utópicas das condutas sociais a partir das suas significações”.

Tais tipos são irredutíveis uns em relação aos outros, são descontínuos e qualitativos.

São estilizações conscientes e desejadas, onde se acentua, se elimina, se exagera, para atingir imagens coerentes de aspecto original que podem servir de quadros de referência operativos (ib.p.31).

Segundo GURVITCH, Max WEBER deu um duplo passo em frente ao reconhecer o caráter qualitativo e descontinuista dos tipos construídos pela sociologia e ao recusar a renúncia à explicação em favor da compreensão, de que padeceu DILTHEY.

Nada obstante, seus reveses podem ser bem apreciados no seguinte:

A ligação arbitrária da compreensão e da interpretação subjetiva;

A impossibilidade em justificar a passagem das significações internas ou subjetivas para as significações sociais e culturais;

A sua renúncia a todos os critérios objetivos que permitem construir tipos;

A ligação dos critérios a um culturalismo abstrato;

A dispersão e a inaptidão desses mesmos critérios para serem aplicados aos fenômenos sociais e às suas estruturas;

A destruição da realidade social por um nominalismo probabilista e individualista que torna WEBER incapaz de apreender a sociedade, os grupos, as classes, os Nós-outros, bem como as suas obras diretas (demolição esta, acrescenta GURVITCH, dissimulada pela imensa erudição histórica de Max WEBER);

A combinação do formalismo, do culturalismo e do psicologismo que não se sintetizam, e que permanecem desligados uns dos outros;

A ausência, enfim, de qualquer orientação dialética.

A crítica de GURVITCH insiste pois nestes últimos defeitos, sobretudo na ausência de orientação dialética, “que impediu a WEBER de apreender as totalidades concretas”, o que o permitiria ultrapassar a consciência fechada. Quer dizer, o impediu de chegar a ver que a compreensão e a explicação são apenas momentos do mesmo processus, e que a tipologia qualitativa não pode ser aplicada no vazio.

GURVITCH não apenas se opõe ao culturalismo abstrato, mas critica a ausência de uma teoria dinâmica no próprio pensamento probabilitário em WEBER, sua limitação pelo nominalismo e o individualismo, na “teoria das oportunidades das condutas individuais”.

Por contra, para estabelecer um contraste, todo o pensamento de GURVITCH baseia-se no caráter intermediário dos tipos sociológicos; na afirmação de que os tipos sociológicos “representam quadros de referência dinâmicos adaptados aos fenômenos sociais totais e chamados a promover a explicação em sociologia”;

Daí decorre a importância de distinguir entre generalização, singularização e sistematização, bem como entre repetição e descontinuidade, sem falar na distinção entre explicação e compreensão, pois estas distinções e critérios dos tipos sociológicos só podem ser utilizados numa orientação de teoria dinâmica.

Segundo GURVITCH, o método de estudo da realidade social consiste na tipologia qualitativa e descontinuista que se liga, necessariamente, (a)- “à aplicação de uma visão de conjunto recusando-se a sacrificar tanto a unidade quanto a multiplicidade”, por um lado e, por outro lado, (b)- “ao recurso aos procedimentos do hiperempirismo dialético”, os únicos que, no dizer do nosso autor, “se mostram capazes (a)- de frustrar a tentação de mumificar os tipos e estabilizar a visão de conjunto e (b)- de fazer sobressair toda a complexidade do método da sociologia”.

GURVITCH põe em relevo os dois pontos seguintes:

º que os tipos sociológicos podem repetir-se e por isso o método tipológico generaliza até um certo limite, mas para fazer assinalar a especificidade do tipo, e constrói diferentes tipos em função da variedade dos quadros sociais reais e suas estruturas, como um método singularizante, mas só para reencontrar os quadros suscetíveis de se repetirem.

Da mesma maneira, o método tipológico utiliza os dados da história, mas só para acentuar as descontinuidades ou rupturas não apenas (a)- entre Nós-outros, grupos, classes, sociedades globais, por um lado, mas também, (b)- por outro lado, entre fenômenos sociais totais e suas estruturas.

Desta forma, são distinguidos três gêneros de tipos sociológicos: (a)- os tipos microssociológicos ou tipos de ligações sociais: os Nós-outros, as relações com Outrem; (b)- os tipos de agrupamentos particulares e classes sociais; (c)- os tipos de sociedades globais.

São distinguidos, no desdobramento, as três espécies dos tipos: (a)- a espécie microssocial é abstrata; (b)- a espécie dos agrupamentos particulares é abstrata concreta; (c)- enquanto que as classes sociais e as sociedades globais são de espécie concreta.

º O segundo aspecto do método da sociologia consiste em tomar sempre em consideração todas as camadas, todas as escalas, todos os setores da realidade social ao mesmo tempo e de chofre, aplicando-lhes uma visão de conjunto –isto é, como dissemos: em ligação com os procedimentos do hiperempirismo dialético, pois que se trata de estudar o vaivém, a interpenetração e a tensão (a)- entre as camadas, as escalas; (b)- entre os elementos anestruturais, estruturados, estruturáveis; (c)- entre o espontâneo e o organizado; (d)- entre os movimentos de estruturação, de desestruturação e de reestruturação; e ainda, (e)- entre o indivíduo e a sociedade.

Finalmente, GURVITCH sintetiza que o pluralismo hiperempírico é essencialmente a característica do método da sociologia, é a sua forma específica de aplicar a visão de conjunto, sem absorver a multiplicidade na unidade.

 

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Mais informação no artigo Culturalismo e Sociologia, de Jacob (J.) Lumier.

 

 

Notas de Fim

[i]          Esse Nós-outros que Max Weber menciona é o que se apreende e se afirma desde o ponto de vista do homem como tal, sendo daí que ele apresenta sua definição de cultura como um segmento finito investido pelo pensamento de uma significação e de uma importância no seio do porvir mundial infinito e estranho a toda a significação.

[ii]       Neste seu recusar a proposição do retorno originário à natureza Max Weber assinala um problema dos anos vinte que um antigo frequentador dos círculos weberianos como Ernst Bloch tratará com espírito crítico mais aprofundado ao examinar o legado do passado dentro do processus histórico e sustentar a tese de que, como matéria das contradições contemporâneas, o legado do passado não pode ser adequadamente contemplado caso o enfoque seja limitado ao capitalismo como ao presente em seu estágio último. Na análise do tradicional como positividade há que distinguir outra matéria diferenciada: a matéria de uma contradição que se rebela a partir de forças produtivas absolutamente não-desencadeadas: que se rebela a partir de conteúdos intencionais de uma espécie que permanece sempre não-contemporânea. O fundamento da contradição não-contemporânea é o conto irrealizado do bom velho tempo, o mito literário, a lenda fabulosa mantida sem solução do velho ser obscuro da natureza. Nessa lenda fabulosa se encontra um passado não superado desde o ponto de vista do desenvolvimento das oposições econômicas, mas sob o aspecto material também é um passado que não foi ainda dignificado como passado. Cf. Bloch, Ernst: Héritage de ce Temps (Erbschaft dieser Zeit, Zürich, 1935), tradução de Jean Lacoste, Paris, Payot, 1978, 390 pp.

[iii] Contra a tese que pretende separar análise estrutural e análise histórica, Georges Gurvitch sustenta que o procedimento de apreciar em um só conjunto e aí contrapor grupo e estrutura na análise sociológica é válido, não só para agrupamentos de grande envergadura, como os estratos numa classe social, os desempregados, os produtores e os consumidores, mas para os agrupamentos particulares funcionais, já que: 1) – não pode deixar de haver certa semelhança entre grupo e estrutura, sendo característica de todos os agrupamentos o fato de serem estruturáveis, como já mencionado; ademais, a possibilidade de uma estrutura não se confunde, e não é nem estruturação, nem estrutura adquirida; 2) – num grupo não-estruturado, as relações com os outros grupos e com a sociedade global ficam fluidas; 3) – é somente quando começa a estruturação que essas relações se tornam precisas, quer dizer, que se coloca toda uma série de questões a propósito de como o grupo se integra na sociedade global e da medida da sua tensão com os outros grupos; 4) – por isso, assinala Gurvitch, os mesmos grupos específicos podem adquirir estruturas variadas em função da sua integração nos diversos tipos de sociedades globais, como o grupo familiar, que ora é família doméstica, ora é família conjugal, ora é família-lar; como, igualmente, o grupo profissional, que ora aparece fazendo parte da família doméstica, ora identificado a uma confraria mágica, ora fazendo um todo com uma casta, ora tomando o caráter de uma associação voluntária, etc.; 5) – por fim, é indiscutível que um grupo não-estruturado em um tipo de sociedade global, como é o caso das indústrias, o dos consumidores, ou, ainda, o dos estratos tecnocráticos, em regime de capitalismo concorrencial, pode vir a estruturar-se muito fortemente noutros tipos de sociedades globais, como é ainda o caso dos grupos mencionado uma vez postos sob o regime do capitalismo dirigista. Ver GURVITCH, Georges (1894-1965): “A Vocação Actual da Sociologia – vol.I: na senda da sociologia diferencial”, tradução da 4ªedição francesa de 1968 por Orlando Daniel, Lisboa, Cosmos, 1979, 587pp. (1ªedição em Francês: Paris, PUF, 1950).

[iv] Ver o artigo Culturalismo e Sociologia.

[v] E Gurvitch acrescenta: toda a explicação pressupõe a integração em um conjunto que compreendemos e toda a compreensão é precisamente a apreensão das significações que se inserem nesse conjunto.